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Eu iniciei minha carreira sendo desenvolvedor front-end. Depois abri uma empresa. Sai dessa empresa e passei a coordenar times de produto em uma empresa de tecnologia. Nessa empresa, além de coordenar o time, eu absorvia responsabilidades de Agile Coach. Saí de lá e virei Product Manager, depois Diretor de Produtos e atualmente eu sou Head de Produtos em uma empresa de tecnologia.
Deslocado
Durante muito tempo eu me cobrei por não estar inserido em uma especialidade. Eu era definido pela responsabilidade que eu estava atuando no momento. Vivia em uma crise de identidade gigante, porque eu achava que eu deveria performar como os especialistas daquela área que eu estava inserido, principalmente quando eu era dev. Eu entendia perfeitamente que eu não tinha habilidade e nem conhecimento (e depois descobri que eu também não tinha interesse) suficiente, mas como estava inserido nesse ambiente, eu deveria estar entre os melhores e isso desgraçava a minha cabeça. Embora eu tenha feito uma carreira muito bonita e maravilhosa no mercado de front-end, eu me sentia incomodado, por vários motivos. Para citar só três:
- Eu não achava que tinha habilidades e talentos suficientes para ser um “programador”. Eu tinha habilidade pra ser front-end e era um dos bons, mas com certeza, eu não tinha aptidão nenhuma para progredir para outros níveis;
- Eu sempre me interessava mais por outros assuntos, como design, gestão, negócios… Lia mais sobre design, gestão e administração do que sobre código, por exemplo;
- Eu tinha dificuldades para enxergar como o meu trabalho estava gerando impacto para o produto, para as pessoas e para o negócio;
- Como eu estava inserido em diversos grupos diferentes, muitos dos assuntos que eu conectava, não fazia sentido para os especialistas;
Na minha cabeça eu só poderia ser alguém especialista. E se é pra ser especialista, você tem que ser alguém que realmente cause impacto no mercado. Que se destaque. E quando eu não conseguia me destacar, isso me impactava negativamente.
ser generalista é ruim?
Em combinação a isso, eu sempre ouvia muito que ser generalista era muito ruim e que isso deveria ser evitado. Você conhece o ditado do generalista e o pato, né? Então, essa coisa tão besta, me bloqueava e maltratava muito a visão que eu tinha sobre mim mesmo. Em todos os grupos que eu participava, o generalismo era visto como algo pejorativo. Demorou para eu entender que os grupos que eu estava inserido eram formados por especialistas, com conhecimentos profundos em apenas uma vertical, e que por isso essas opiniões estava recheadas de vieses e costumes focados.
Mas agora, depois dos 36 anos, com 20 anos de carreira, eu estou bem mais leve depois que me reconheci como um profissional generalista. Essa guinada aconteceu (mesmo eu sem perceber imediatamente) a partir do momento que eu iniciei um trabalho mais focado na gestão produtos, abordando assuntos diversos todos os dias, dado que essa responsabilidade tem como base inicial ser um bom generalista, tendo visão de tecnologia, experiência de usuário e negócio/mercado.
Generalismo não é superficialidade
É importante notar que generalismo difere de superficialidade. Ser superficial significa que você sabe muito pouco sobre um determinado assunto. Ser generalista é se aprofundar o suficiente e com eficácia em diversos assuntos, possibilitando a conexão entre esses assuntos produtivamente e acionável. Você precisa entender mecanismos, entender causas e efeitos, entender os processos, estruturas e organizações que formam as disciplinas que você está se envolvendo.
Duas dicas bem importantes que aprendi sendo generalista:
- Cuidado para não cair no efeito Dunning-Kruger;
- Ter sido especialista antes me ajudou a ser um generalista melhor;
T-Shaped: The New Breed of IT Professional | Cutter Consortium
O David Epstein escreveu um livro exatamente tratando sobre a progressão dos generalistas no mercado. O que ele diz no livro é que quanto mais você experimenta, ou seja, passa por uma fase de amostragem, você adquire uma visão maior das suas habilidades, além de combinar experiências de várias áreas do conhecimento.
O que aprendemos ao sermos generalistas:
- Pensamento multi disciplinar;
- Experiência ampla em diversas áreas;
- Troca de experiências e conhecimento entre disciplinas;
- Visão ampla de impactos entre áreas e mercados;
- Cria soluções para problemas conectando pontos de vista de diversas áreas;
O que o Epstein diz no livro, é que você também não precisa ser generalista a vida inteira. Assim como ter sido especialista me ajudou a ser um generalista melhor, ser generalista pode te ajudar a ser um especialista melhor. Para quem trabalha gerindo Produtos Digitais, a tendência é achar que sua carreira é ser generalista para sempre, mas não. Contando um segredo para vocês aqui: eu quero terminar trabalhando numa área de estratégia. Quero dominar ferramental e parte teórica. Quero ser especialista nessa área e me aprofundar cada vez mais. Para mim, esse é um dos caminhos mais naturais para quem trabalha com produto. Mas esse é outro papo.
Game Developer Valve Hiring Strategy - Business Insider
No final eu entendo que todo mundo se torna um especialista em determinado assunto ou setor. Isso é muito claro para mim, e o Epstein diz bastante sobre isso no livro, destacando que iniciar uma carreira mais generalista aumenta sua possibilidade de ser um especialista acima da média. Generalistas se tornam
Você já passou por isso?
Referências:
- How to Build a Strong Career in Tech
- Range: Why Generalists Triumph in a Specialized World | Amazon.com.br
- Michael Hecht: Generalists Evolve Into Specialists on Vimeo
- As vantagens de não ser um especialista, segundo este livro | Nexo Jornal
- Generalist vs Specialist – Guide to Purposeful Success
- IBM100 - The Invention of Service Science
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